ENTREVISTA

Irradiação de alimentos: descubra tudo sobre a técnica radiológica

Luana G. Silveira/ASCOM CONTER*
05/04/2022
ENTREVISTA

Técnica assegura maior prazo de validade e elimina possíveis parasitas dos produtos

Além do trabalho dentro dos hospitais e clínicas, existem outras áreas do conhecimento radiológico em que os profissionais podem se aventurar! Uma delas, é a irradiação de alimentos, processo que os submete a uma dose controlada de radiação ionizante. A prática propicia o aumento da vida útil, de modo que inibe ou retarda alguns processos fisiológicos (como o brotamento e o amadurecimento), além de inativar larvas e parasitas e reduzir a carga de fungos e bactérias.

Para entender melhor sobre irradiação de alimentos, o CONTER convidou a diretora de comunicação institucional Denise Levy, e o secretário regional Alfredo Ferreira Filho, ambos da Sociedade Brasileira de Proteção Radiológica (SBPR). Confira a seguir:

CONTER - O que é a irradiação de alimentos? Como funciona o procedimento e quais seus benefícios para a indústria e o consumidor?

SBPR: A irradiação de alimentos é uma técnica para preservação e desinfestação de alimentos, submetidos   a   doses   controladas   de   radiação ionizante para   eliminação   de   insetos   ou   redução   de microrganismos que contribuem para deterioração e comprometem a segurança do alimento. Podem ser utilizadas fontes de Cobalto-60, Césio-137, raios X e feixe de elétrons.

As finalidades da irradiação de alimentos são: inibição do brotamento, atraso no processo de maturação, desinfecção de insetos, desinfecção de parasitas, redução da carga microbiana e redução de fungos. Além disso, a irradiação de alimentos no pós-colheita amplia as possibilidades de comércio entre países para controle fitossanitário quarentenário. Grande parte dessas finalidades podem ser obtidas com baixas doses de radiação.

Uma grande vantagem desta tecnologia é que pode ser realizada após o alimento já embalado, reduzindo significativamente o risco de recontaminação durante as fases de transporte, armazenamento e comércio dos produtos alimentícios.

 

CONTER: O procedimento é seguro? Explique. 

SBPR: O processo de irradiação é seguro, pois não deixa resíduos no alimento nem libera material radioativo no meio ambiente. Todo o processo é monitorado para garantir a qualidade do alimento e preservação de suas qualidades sensoriais e nutricionais. Evidentemente, nem todas as técnicas de preservação servem para todos os tipos de alimentos. No caso da irradiação, não é aconselhável para alimentos muito gordurosos (como manteiga, por exemplo), pois afetaria suas propriedades sensoriais (cor, textura, sabor).

 

CONTER: Qual é a aderência ao procedimento pela indústria brasileira? Por que não ouvimos falar sobre o procedimento e não encontramos produtos irradiados nos mercados com facilidade?

SBPR: Há três pontos a serem considerados: investimentos em irradiadores para a irradiação de alimentos em escala comercial; informação aos produtores, indústria e comércio; informação à população. Em relação à escassez de irradiadores que atendam em escala comercial: hoje apenas uma empresa na região sudeste oferece o serviço de irradiação de alimentos em escala industrial. Em relação à aderência por parte das indústrias, além do investimento tecnológico, é necessário investir na aceitação pública.

Quanto a produtos irradiados no mercado, há muitos e são bastante comuns, como por exemplo o macarrão instantâneo (cujos temperos são irradiados). Este e outros produtos irradiados trazem essa informação na rotulagem, conforme exigência da Anvisa em sua RDC 21, de 26 de janeiro de 2001, que aprova o regulamento para a irradiação de alimentos.

 

CONTER: Na sua opinião, o que pode ser feito para a aderência das indústrias ao procedimento? Em relação ao consumidor, o que falta para conhecer/entender sobre irradiação de alimentos e achar seguro?

SBPR: Em relação à informação aos produtores, indústria e comércio, muitos esforços são empreendidos pelas instituições e sociedades científicas. A SBPR, por exemplo, promoveu, em 2021, um simpósio sobre irradiação de alimentos destinado à informação de profissionais do agronegócio e indústria.

Em relação ao público consumidor, uma pesquisa realizada no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) demonstra que, no geral, os entrevistados não sabiam a diferença entre "alimentos irradiados" e "alimentos contaminados" e confundiam “alimento irradiado” com “alimento radioativo”. É preciso promover ações efetivas e eficazes para a comunicação com a sociedade.

 

CONTER: Como esse procedimento pode ajudar na situação de insegurança alimentar no país? No momento atual, se o procedimento fosse aplicado nos alimentos, poderia encarecer ainda mais o valor repassado ao consumidor?

SBPR: A irradiação contribui em duas questões cruciais em nosso país: combate ao desperdício, com o prolongamento do tempo de vida de prateleira dos alimentos; e segurança alimentar com a eliminação de insetos e parasitas e redução de patógenos que representam risco à saúde do consumidor, causadores de surtos alimentares e DTAs.

Em relação a custos, uma reflexão: o público sabe que o Brasil investe em uso de agroquímicos e inseticidas que sabidamente deixam resíduos nos alimentos, promovem resistência dos insetos e microrganismos, liberam resíduos no meio ambiente, comprometem o equilíbrio ecológico e a saúde do trabalhador. E o custo dos agrotóxicos também é repassado ao consumidor! A irradiação de alimentos apresenta vantagem em todos esses quesitos, com a vantagem que, uma vez construídas as instalações, o custo desta técnica no longo prazo é bastante baixo, comparado ao tratamento com agroquímicos.

Saiba mais

A irradiação é regulamentada pela Food and Drug Administration (FDA) desde 1963. Já no Brasil, as primeiras pesquisas surgiram na década de 1950, pelo Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA). A técnica foi introduzida na legislação sanitária do Brasil no Decreto-Lei n° 986/PR, de 21/10/1969, instituído pelos Ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, tendo como objetivo a defesa e a proteção da saúde individual e coletiva, que legislava, inclusive, sobre a rotulagem dos alimentos irradiados.

Em 1973, foi publicado o decreto presidencial n° 72.718, que estabeleceu normas gerais sobre irradiação de alimentos no Brasil. A RDC 21/2001 da Anvisa e Instrução Normativa Nº 9 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) regulamentam a técnica no país.

 

*texto sob a supervisão de Jônathas Oliveira